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11 de Maio de 2024

A controvérsia do cabimento da prisão temporária

há 8 anos

Trata-se de uma espécie de prisão processual regulamentada por lei específica (Lei nº 7.960, de 21 de dezembro de 1989[1]), tendo seu cabimento quando da sua imprescindibilidade para as investigações do inquérito policial, quando o indiciado não comprovar onde reside ou que tenha a sua identificação prejudicada por algum motivo de ordem material ou fática, ou ainda, quando houver fundadas razões da autoria ou da participação em crimes tipificados na legislação regente.

O tema mostra-se controverso e a doutrina diverge acerca da sua concepção e aplicabilidade: os processualistas a classificam como sendo uma medida cautelar de natureza pessoal, que visam assegurar a utilidade do provimento jurisdicional final, revestindo-se das características da instrumentalidade, provisoriedade e acessoriedade.

Diz-se que é instrumental porque a partir dela pode-se alcançar o que se busca como principal no processo penal; é provisória uma vez que seu tempo é limitado em 5 dias prorrogável por igual período, enquanto não alcançado o objetivo principal ou se ainda presentes seus requisitos motivadores; e porquanto acessória, na medida em que está vinculada à principal ação penal, pois, quando esta alcançada, aquela deixará de existir.

Agora, no caso de suspeito de crime hediondo, tortura, tráfico ilícito de substâncias entorpecentes e drogas afins ou de terrorismo, a prisão temporária poderá durar trinta dias, prorrogáveis pelo mesmo prazo (conforme a dicção do artigo 2º, parágrafo 4º, conforme a lei nº 8.072/1990[2]).

De outro modo, há doutrinadores que a colocam como uma mera finalidade investigatória, podendo ensejar, até, com a soltura do indiciado no fim das ações persecutórias realizadas pela autoridade policial.

Ademais, há ainda uma ala doutrinária que imputa-lhe caráter inconstitucional, vez que ofende o artigo 22, inciso I, da CF/88[3], que preceitua que matéria de processo penal e direito penal são de iniciativa privativa da União, dessa forma, de ordem formal, além do que, entende esta corrente, que, em se tratando de um Estado Democrático de Direito não há que conceber prisão antes da investigação, até para evitar a ocorrência em erro grave materializado na ofensa ao princípio da presunção da inocência ou da não-culpabilidade (art. 5º, inciso LVII, da CF/88[4]).

O mestre Sérgio de Oliveira Médici (2000, p. 118) demonstra a existência de quatro considerações doutrinárias distintas acerca do cabimento da prisão temporária, diz ele que:

  1. Segundo Tourinho Filho e Julio Mirabete, é cabível a prisão temporária em qualquer das três situações previstas na lei, ou seja, os requisitos são alternativos: ou um, ou outro;
  2. Para Antonio Scarance Fernandes, a prisão temporária só poderá ser decretada se estiverem presentes as três condições, ou seja, os requisitos são cumulativos;
  3. No entender de Damásio de Jesus, Antonio Magalhães Gomes Filho e Fernando Capez (2014, p.166), a prisão temporária só poderá ser decretada naqueles crimes previstos em lei, desde que concorra qualquer uma das duas primeiras situações. Dessa forma, se a medida for imprescindível para as investigações ou se o endereço ou identificação do indiciado forem incertos, caberá a prisão cautelar, se o crime for um dos indicados pela lei; e
  4. Na visão do eminente autor Vicente Greco Filho, a prisão temporária poderá ser decretada em qualquer das situações legais, desde que, com ela, concorram os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312 do CPP[5]).

Portanto, como vimos, o leque de interpretações doutrinárias sobre o tema em epígrafe enriquece as discursões, ensejando, de um lado, uma certeza de que o assunto não se encerra de per si, a despeito de haver entendimentos pacificados dos Tribunais, e, de outro lado, abre-se uma porta para eventuais jurisprudências decorrentes do juízo de subsunção relativo a cada caso concreto, obedecendo, por assim dizer, a evolução da sociedade que pulsa com as necessidades e interatividades dos seus segmentos, e, o direito, por sua vez, não deve olvidar-se de acompanhá-la, assegurando, dessa forma, a devida proteção aos jurisdicionados.

Por oportuno, ressaltamos o aspecto tempestivo da sua aplicabilidade, ou melhor, e aqui vai uma indagação: seria adequada sua decretação no curso do processo penal? Vejamos, o seu condão, segundo a lei esparsa, é de natureza meramente investigatória, ou seja, sua aplicabilidade somente poderá ser requerida somente enquanto perdurar a persecução criminal, ou seja, na fase de instrução penal, neste momento ainda não há réu, mas sim indiciado, diferentemente da incidência da prisão preventiva[6], que poderá ser requerida tanto naquela fase quanto na fase do processo penal.

[1]

Art. 1º Caberá prisão temporária:

I - quando imprescindível para as investigações do inquérito policial;

II - quando o indicado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade;

III - quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes:

a) homicídio doloso (art. 121, caput, e seu § 2º);

b) seqüestro ou cárcere privado (art. 148, caput, e seus §§ 1º e 2º);

c) roubo (art. 157, caput, e seus §§ 1º, 2º e 3º);

d) extorsão (art. 158, caput, e seus §§ 1º e 2º);

e) extorsão mediante seqüestro (art. 159, caput, e seus §§ 1º, 2º e 3º);

f) estupro (art. 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único);

g) atentado violento ao pudor (art. 214, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único);

h) rapto violento (art. 219, e sua combinação com o art. 223 caput, e parágrafo único);

i) epidemia com resultado de morte (art. 267, § 1º);

j) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte (art. 270, caput, combinado com art. 285);

l) quadrilha ou bando (art. 288), todos do Código Penal;

m) genocídio (arts. , e da Lei nº 2.889, de 1º de outubro de 1956), em qualquer de sua formas típicas;

n) tráfico de drogas (art. 12 da Lei nº 6.368, de 21 de outubro de 1976);

o) crimes contra o sistema financeiro (Lei nº 7.492, de 16 de junho de 1986).

p) crimes previstos na Lei de Terrorismo. (Incluído pela Lei nº 13.260, de 2016)

(...)

[2]

(...)

Art. 2º Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de: (Vide Súmula Vinculante)

I - anistia, graça e indulto;

II - fiança. (Redação dada pela Lei nº 11.464, de 2007)

(...)

§ 4o A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei no 7.960, de 21 de dezembro de 1989, nos crimes previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade. (Incluído pela Lei nº 11.464, de 2007)

[3]

(...)

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

(...)

[4]

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

[5]

(...)

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o). (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

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